quarta-feira, 10 de julho de 2013

ARTIGO DE REVISÃO Mobilização precoce na fase aguda da trombose venosa profunda de membros inferiores

www.jvascbr.com.br


Discussão

Durante muito tempo, preconizou-se repouso absoluto no leito como tratamento da TVP aguda. O protocolo comumente utilizado na prática hospitalar consiste em repouso, elevação de membros inferiores e anticoagulantes até que se obtenha a estabilidade do trombo1,15. Entretanto, muitos estudos sugerem ser a deambulação precoce recomendada para a maioria dos pacientes com TVP, devendo haver maior precaução com indivíduos com histórico de EP prévia13,15,17,18,29,30,32
.
Pesquisas têm demonstrado que a prescrição de repouso no leito para pacientes com TVP não reduziu a incidência de EP a ponto de influenciar significativamente a evolução clínica13,15,17,18,30,32. Do ponto de vista fisiopatológico, a imobilização produz consequências decorrentes da estase venosa, revelando-se como um dos mais importantes fatores discriminados por Virchow como sendo responsáveis pela trombogênese. A inatividade do mecanismo de bombeamento do sistema venoso proporcionado pelos músculos dos membros inferiores (“bomba muscular”) e a atividade fibrinolítica deprimida são outros fatores que contribuem para a formação e propagação do trombo, com sequelas pós-trombóticas graves4,33
.
Quando se compara a evolução de pacientes deixados em repouso no leito com os mobilizados precocemente, tem-se observado ausência de diferença 82 J Vasc Bras 2009, Vol. 8, Nº 1 Mobilização precoce de trombose venosa profunda – Penha GS et al.significativa no aparecimento de EP13-17,28, embora se afirme que a mobilização precoce contribuiria para a redução da progressão do trombo16,28. 

Partsch et al.16 argumentou que a deambulação precoce poderia ser um aspecto protetor, uma vez que reduz a estase venosa, um dos fatores de risco para TVP recorrente ou progressiva. Os dados reportados por Partsch & Blättler16 sugeriram que a deambulação em combinação com anticoagulação e compressão da perna em pacientes com TVP na fase aguda conduziria a uma regressão mais rápida de sintomas e sinais clínicos, como dor, edema, hiperemia e aumento de temperatura. Isma et al.14 corroborou, indicando que a mobilização precoce é o tratamento adequado para sintomatologia clínica dos pacientes, acrescentando ter sido observada melhora na qualidade de vida desses indivíduos.

Killewich et al.34 mencionam que regressão da TVP aguda ocorre devido ao aumento da atividade fibrinolítica endógena e do ativador de plasminogênio tecidual.
O exercício físico acentua a atividade fibrinolítica endógena manifestada como uma diminuição no inibidor do ativador do plasminogênio34
.
Fischer35, em 1910, recomendava ataduras com emplastro de zinco para tratar pacientes com trombose, especulando que a firme compressão externa fixaria os coágulos na parede das veias. O efeito físico da compressão externa verificada no estudo realizado por Partsch et al.36, demonstrado por meio da flebografia, evidenciou ação contra a formação do edema decorrente do estreitamento das veias superficiais e profundas. Os mesmos autores concluíram que os materiais inelásticos, como o emplastro de zinco, são mais eficazes que o material elástico na redução da estase venosa local. 

Portanto, os resultados encontrados nos estudos realizados por Partsch & Blättler16 e Blättler & Partsch27 demonstraram que o grupo de compressão inelástica apresentou efeitos superiores em reduzir os sinais e sintomas clínicos. Em todos esses estudos mencionados, houve utilização de meias de compressão, o que impossibilitou avaliar o efeito isolado da mobilização precoce.
A propagação do trombo foi observada em cerca de 20% dos pacientes, apesar de tratamento adequado com heparina e mobilização tardia. Porém, esse valor cai para 1% se a mobilização for instituída precocemente37. 
propagação do trombo foi relacionada ao nível de anticoagulação, tendo sido provavelmente influenciada pelo grau de estase37. Por isso, no paciente com TVP, tem sido proposta a mobilização aliada a heparina de baixo peso molecular imediatamente após o diagnóstico28,29,31,32,34
.
No estudo realizado por Isma et al.14, não foi observado nenhum benefício substancial do exercício na recanalização venosa, haja vista que o acompanhamento foi tardio, efetuado 6 meses depois do fim do protocolo de estudo, inviabilizando a análise do efeito da mobilização na fase aguda. 
A pontuação de severidade relativamente baixa em ambos os grupos dificultou a avaliação dos eventuais efeitos do exercício.
Os sintomas provenientes da TVP resultam, parcialmente, de um aumento na pressão intracapilar e de posterior transudação de fluido dos capilares para o espaço intersticial38, ocasionados pelo obstáculo ao fluxo sanguíneo venoso e pela insuficiência valvar39. 
Tais fenômenos prejudicam a perfusão muscular da perna,promovendo a fadiga muscular38
.
Os efeitos potencialmente benéficos da mobilização precoce relacionam-se à teoria da bomba muscular da panturrilha e ao treino muscular17. 
Durante a contração muscular, ocorre aumento na habilidade de ejeção, facilitando o retorno venoso, o que, por sua vez, reduz o gradiente de pressão hidrostática, responsável pela formação do edema40-42, bem como melhora a perfusão muscular potencializando sua ação38. 
O estudo de Partsch et al.16 corroborou ao relatar que compressão externa da perna, aliada ao programa de caminhadas, proporcionaria redução na pressão hidrostática sanguínea e, consequentemente, diminuiria os sintomas e sinais venosos.
A qualidade dos artigos, ensaios clínicos controlados e estudos epidemiológicos pesquisados neste estudo permitiu que os resultados, a discussão e, consequentemente, as conclusões, fossem fundamentadas em um bom grau de evidência científica. 
Os principais estudos pesquisados e citados são internacionais, oriundos de países desenvolvidos. 
Existe uma lacuna de pesquisas realizadas no Brasil e América Latina sobre o tema, Mobilização precoce de trombose venosa profunda – Penha GS et al. J Vasc Bras 2009, Vol. 8, Nº 1 83diante da qual fica a sugestão para a realização de estudos experimentais no Brasil, o que poderia fornecer subsídios em prol da proposta de mobilização precoce no âmbito hospitalar em nosso meio.

Conclusão

Opondo-se à estratégia de restrição ao leito, estudos recentes, avaliados nesta revisão, demonstraram os benefícios na redução da dor e edema, com melhora da qualidade de vida, pela estratégia terapêutica de deambulação precoce em combinação com anticoagulação e compressão da perna em pacientes com TVP, sem que fosse verificada maior incidência de desfechos relevantes, como EP e morte.

Referências
1. Maffei FHA, Lastoria S, Yoshida WB, Rollo HA. Doenças
vasculares periféricas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Medsi; 2002. vol.
2.
2. Mello NA. Síndromes vasculares: clínica, diagnóstico,
tratamento. São Paulo: Fundo Editorial BYK; 1999. p. 383.
3. Verstraete M, Vermylen J.Trombose. São Paulo: Sarvier; 1989.
p. 356.
4. Labas P, Ohrádka B, Vladimír J, Cambal M. The home
treatment of deep vein thrombosis with low molecular weigth
heparin, forced mobilisation and compression. Int Angiol.
2000;19:303-7.
5. Maffei, FHA. Trombose venosa profunda dos membros
inferiores: incidência, patologia, fisiopatologia e diagnóstico.
In: Maffei FHA, Lastoria S, Yoshida WB, Rollo HA. Doenças
vasculares periféricas. 3ª ed. São Paulo: Medsi; 2002.
p. 1363-86.
6. Fowkes FJ, Price JF, Fowkes FG.Incidence of diagnosed deep
vein thrombosis in the general population: systematic review.
Eur J Vasc Endovasc Surg. 2003;25:1-5.
7. Anderson FA, Wheeler HB, Goldberg RJ, et al.A population
based perspective of the hospital incidence and case-fatality
rates of deep vein thrombosis and pulmonary embolism: the
Worchester DVT Study. Arch Intern Med. 1991;151:933-8.
8. National Institutes of Health Consensus Conference.
Prevention of venous thrombosis and pulmonary embolism.
JAMA. 1986;256:744-9.
9. Diebold J, Löhrs U. Venous thrombosis and pulmonary
embolism. A study of 5039 autopsies. Pathol Res
Pract.1991;187:260-6.
10. Saeger W, Genzkow M. Venous thrombosis and pulmonary
embolisms in post-mortem series: probable causes by
correlations of clinical data and basic diseases. Pathol Res
Pract. 1994;190:394-9.
11. Lindblad B, Sternby NH, Berqqvist D. Incidence of venous
thromboembolism verified by necropsy over 30 years. BMJ.
1991;302:709-11.
12. Aldrich D, Hunt DP. When can the patient with deep venous
thrombosis begin to ambulate? Phys Ther. 2004;84:268-73.
13. Aschwanden M, Labs KH, Engel H, et al. Acute deep vein
thrombosis: early mobilization does not increase the frequency
of pulmonary embolism. Thromb Haemost. 2001;85:42-6.
14. Isma N, Johanssson E, Björk A, et al.Does supervised exercise
after deep venous thrombosis improve recanalization of
occluded vein segments? A randomized study. J Thromb
Thrombolysis. 2007;23:25-30.
15. Partsch H, Oburger K, Mostbeck A, König B, Köhn H.
Frequency of pulmonary embolism in ambulant patients with
pelvic vein thrombosis: a prospective study. J Vasc Surg.
1992;16:715-22.
16. Partsch H, Blättler W. Compression and walking versus bed
rest in the treatment of proximal deep venous thrombosis with
low molecular weight heparin. J Vasc Surg. 2000;32:861-9.
17. Schellong SM, Schwarz T, Kropp J, Prescher Y,
Beuthien-Baumann B, Daniel WG. Bed rest in deep venous
thrombosis and the incidence of scintigraphic pulmonary
embolism. Thromb Haemost. 1999;82(suppl 1):127-9.
18. Schaub RG, Simmons CA, Koets MH, Romano PJ 2nd,
Stewart GJ.Early events in the formation of a venous thrombus
following local trauma and stasis. Lab Invest. 1984;51:218-24.
19. Albuquerque HPC, Vidal PC. Trombose venosa profunda:
revisão dos conceitos atuais. Rev Bras Ortop. 1996;31:851-6.
20. Sikorski JM, Hampson WG, Stadsdon GE.The natural history
and a etiology of deep vein thrombosis after total hip
replacement. J Bone Joint Surg Br. 1981;63-B:171-7.
21. Thomas DP, Meston RE, Wood RD, Hockley DJ. The
relationship between vessel wall injury and venous thrombosis:
an experimental study. Br J Haematol. 1985;59:449-57.
22. Brenner BM, Troy JL, Ballerman BJ.Endothelium-dependent
vascular responses. J Clin Invest. 1989;84:1373-8.
23. Hirsh J, Hull R. Venous thromboembolism: natural history,
diagnosis and management. Boca Raton: CRC Press; 1987.
p. 17-21.
24. Green D, Hirsh J, Heit J, Prins M, Davidson B, Lensing AW.
Low molecular weight eparin:a critical analysis of clinical
trials. Pharmacol Rev. 1994;46:89-10.
25. Merlo I, Parente JB, Komlós PP. Varizes e telangiectasias:
diagnóstico e tratamento. Rio de Janeiro: Revinter; 2006.
26. Figueiredo MAM., Filho AD, Cabral ALS.Avaliação do efeito
da meia elástica na hemodinâmica venosa dos membros
inferiores de pacientes com insuficiência venosa crônica. J Vasc
Bras. 2004;3:231-7.
27. Blättler W, Partsch H. Leg compression and ambulation is
better than bed rest for the treatment of acute deep venous
thrombosis. Int Angiol. 2003;22:393-400.
28. Partsch H. Therapy of deep vein thrombosis with low
molecular weight heparin, leg compression and immediate
ambulation. Vasa. 2001;30:195-204.
29. Kiser TS, Stefans VA. Pulmonary embolism in rehabilitation
patients: relation to time before return to physical therapy after
diagnosis of deep vein thrombosis. Arch Phys Me Rehabil.
1997;78:942-5.
84 J Vasc Bras 2009, Vol. 8, Nº 1 Mobilização precoce de trombose venosa profunda – Penha GS et al.30. Partsch H, Kaulich M, Mayer W.Immediate mobilisation in
acute vein thrombosis reduces post-thrombotic syndrome. Int
Angiol. 2004;23:206-12.
31. Partsch, H. Ambulation and compression after deep vein
thrombosis: dispelling myths. Semin Vasc Surg.
2005;18:148-52.
32. Jünger M, Diehm C, Störiko H, et al. Mobilization versus
immobilization in the treatment of acute proximal deep venous
thrombosis: a prospective, randomized, open, multicentre trial.
Curr Med Res Opin. 2006;22:593-602.
33. Samama MM, Simonneau G, Wainstein J-P, De Vathaire F,
Huet Y, Landauer D. SIRIUS Study: Epidemiology of risk
factors of deep venous thrombosis of the lower limbs in
community practice. Thromb Haemost. 1993;69:797A.
34. Killewich LA, Macko RF, Cox K, et al.Regression of proximal
deep venous thrombosis is associated with fibrinolytic
enhancement. J Vasc Surg.1997;26:861-8.
35. Fischer H. Eine neue Therapie der Phlebitis. Med Klin.
1910;30:1172-80.
36. Partsch H, Menzinger G, Mostbeck A. Inelastic leg
compression is more effective to reduce deep venous refluxes
than elastic bandages. Dermatol Surg. 1999;25:695-700.
37. Schulman S. Studies on the medical treatment of deep vein
thrombosis. Acta Med Scand Suppl. 1985;704:1-68.
38. Qvarfordt P, Christenson JT, Eköf B, Ohlin P, Saltin B.
Intramuscular pressure, muscle blood flow, and skeletal muscle
metabolism in chronic anterior tibial compartment syndrome.
Clin Orthop Relat Res. 1983;179:284-90.
39. Susan RK, Jeffrey SG. Relationship between deep venous
thrombosis and the postthrombotic syndrome. Arch Intern
Med. 2004;164:17-26. http://archinte.ama-assn.org/cgi/
content/full/164/1/17?. Acessado: 26/10/2008.
40. Stick C, Grau H, Witzleb E. On the edema: preventing effect
of the calf muscle pump. Eur J Appl Physiol. 1989;59:39-47.
41. Padberg FT Jr, Johnson MV, Sisto SA. Structured exercise
improves calf muscle pump function in choronic venous
insufficiency: a randomized trial. J Vasc Surg. 2004; 39:79-87.
42. Journal of Vascular Surgery [site na Internet]. Elsevier, Inc.
http://www.journals.elsevierhealth.com/periodicals/ymva/
article/PIIS0741521403014125/fulltext. Acessado: 12/01/2008.
43. Shrier I, Kahn S R.Effect of physical activity after recent deep
venous thrombosis: a cohort study. Med Sci Sports Exer

Nenhum comentário:

Postar um comentário